sexta-feira, 23 de maio de 2025

E o sobreiro deu Amoras!

Este local é mais um ponto de referência de um itinerário associado ao vale do Arda ( do sul para norte / de Arouca para Paiva), que Adriano Strecht de Vasconcelos, situa já ao tempo do Conde D. Henrique, narrando o episódio lendário da conversão, ao cristianismo, do Rei Mouro de Lamego, e sua família, após a derrota que sofreu no monte e no vale de Santa Eulália. https://www.facebook.com/museumunicipaldearouca/posts/1164829855434052?comment_id=2283974425337824&locale=pt_BR
A Lenda do Milagre do Sobreiro. Nas montanhas e vales do Douro, onde o nevoeiro se ergue como véu dos segredos antigos, viveu Echa Martim, rei mouro de Lamego, altivo e senhor de si, guerreiro de vasto domínio. Conduzido pela espada e pela honra dos seus, encontrou o seu declínio não na morte, mas na transformação. Derrotado em Arouca por D. Henrique de Borgonha e seu fiel vassalo Egas Moniz, Echa Martim não tombou em sangue, mas dobrou o joelho com dignidade. Reconhecendo o valor do inimigo, e movido por uma fé que começava a sussurrar-lhe ao espírito, aceitou tornar-se tributário dos cristãos, mantendo sua honra intacta. Mas o destino, sempre inquieto, não cessava ali sua obra. Na viagem de regresso, atravessando as terras de Paiva e da Raiva, Echa Martim, acompanhado da esposa Ansora e da filha Zara, foi tocado pela mensagem da cruz. O guerreiro mouro e sua família abandonam o Islão e convertem-se ao cristianismo, em pleno coração da serra, num gesto que selou a reconciliação entre dois mundos. O Grito de Zara e o Milagre do Sobreiro. Mas a paz não viria sem justiça. Zara, moça de alma luminosa, carregava em silêncio uma dor negra: fora forçada por D. Nuno de Mansores, senhor feudal cruel, alma de pedra, que mesmo servindo ao Conde, era inimigo da luz. No momento da conversão, Zara não silencia mais — acusa publicamente seu agressor, perante o próprio D. Henrique. D. Nuno, arrogante, duvida da acusação. Mas, num gesto ousado, propõe uma prova: “Se o sobreiro der amoras, estarei culpado. Se não, será minha escrava.” A natureza, instrumento do divino, responde. No momento da missa, o sobreiro floresce frutos de amora, como nunca antes visto. O milagre consagra a verdade. D. Nuno, humilhado e redimido, aceita casar com Zara — não por obrigação, mas por penitência e honra. A justiça de D. Henrique, justa e temperada com clemência, sela o destino: o Couto da Raiva é doado como dote a Zara, e ali se ergue um templo consagrado à Senhora das Amoras, sinal da fé nova que nasceu do sofrimento e da redenção. Echa Martim, já cristão, regressa com Ansora a Lamego, não mais como rei mouro, mas como cristão reconciliado com o destino — um homem que perdeu um trono, mas ganhou uma alma. Esta versão da lenda, ao contrário do heroísmo clássico e do castigo final do mouro vencido, apresenta um drama moral e espiritual profundo. Echa Martim não é o inimigo, mas o convertido. Zara não é apenas vítima, mas símbolo da justiça restauradora. D. Nuno, o vilão, é exposto, mas não destruído — é transformado pela intervenção divina. Essa narrativa revela uma faceta singular da tradição portuguesa: a fusão entre cavalheirismo, justiça divina, e a ideia de reconciliação. Também mostra o papel da mulher como portadora da verdade, e da natureza como testemunha do sagrado.
Martinho Rocha reuniu e escreveu sobre os vários contributos.

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